Entendendo sobre Atenção Primária à Saúde
O cenário atual na saúde suplementar com o crescente aumento nos custos assistenciais, utilização desordenada dos recursos médicos, conflito de interesse no processo de remuneração dos prestadores de serviço e do modelo de assistência voltada ao tratamento da doença, vem desafiando o setor para urgentes mudanças.
Há um movimento no mercado para implantação do modelo de atenção primaria à saúde. Mundialmente, há o reconhecimento da APS como modelo mais adequado, que define acessibilidade, coordenação do cuidado, longitudinalidade (atingir paciente, família e comunidade) e cuidado abrangente, onde as rotinas de atuação incluem os cuidados preventivos e de promoção da saúde. A eficiência no fluxo de usuários dentro do sistema de saúde e os impactos financeiros do setor são evidenciados em países com esta prática.
No setor público, em especial na Europa e Canadá este modelo está mais consolidado. A questão primordial deste tema é como financiar a saúde tanto no setor público como no privado. A boa notícia é que no setor privado há maior conscientização sobre a APS, seus benefícios e da necessidade de implantação para colaborar com a sobrevivência do setor.
Este modelo não é novo, tem origem na estratégia elaborada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 1978 e com iniciativa vencedora em vários países. Na APS, 80% dos problemas de saúde são resolvidos em unidades de saúde sem necessidade de serem encaminhados a serviços especializados que deveriam estar voltados aos casos mais complexos e em situações graves que requerem recursos avançados.
O modelo de APS vem com o conceito de oferecer atendimento personalizado e acolhedor que traz de volta o conceito do médico de família, atuando em conjunto com equipe de profissionais multidisciplinar da saúde de alta qualificação centrados no relacionamento próximo e de longo prazo com paciente, seus familiares e a comunidade. Outros recursos tecnológicos como orientação virtual à distância, prontuários eletrônicos e sistemas de dados integrados são meios necessários para atuação e integração da atenção a saúde. Ainda há premissa na construção de uma rede de referência estruturada na estratégia do modelo de atenção primária à saúde. A estratégia de APS têm avançado por aqui, mesmo que ainda tímida. Segundo a Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge), cerca de 50 operadoras no Brasil já têm projetos voltados à Atenção Primária à Saúde. Isso também é fruto do incentivo da Agência Nacional de Saúde (ANS) que aprovou em 2017 o projeto de atenção primária e desde então várias operadoras têm mostrado interesse no projeto.
Recentemente a Amil, a SulAmérica e a Bradesco Saúde vem mostrando movimento para este modelo. Segundo informações da Amil, hoje, 89% dos beneficiários atendidos por médicos de família em unidades do Amil Espaço Saúde têm seus problemas de saúde solucionados sem necessidade de encaminhamento para outros especialistas. Além disso, há um registro de queda de 30% na hospitalização dos pacientes engajados. A empresa contratou 400 profissionais para compor suas equipes de atenção primária, entre médicos, enfermeiros e técnicos. Também fez uma parceria inédita com a Sociedade Beneficente Israelita Brasileira Albert Einstein para treinamento de 80 médicos em técnicas de atendimento em medicina de família. Para 2019, a previsão é a inauguração de mais unidades do Amil Espaço Saúde.
A SulAmérica vem implementando modelo de APS há cerca de quatro anos e já colhe frutos. A empresa criou uma multiplataforma integrada 24 horas e comemora redução superior a 20% dos atendimentos em Pronto Socorro, que chegam a custar o dobro do realizado em casa pelos médicos de família. A Bradesco Saúde, por sua vez, lançou a Novamed em 2017, uma rede de clínicas com médico da família e algumas especialidade básicas como pediatria, ginecologia e ortopedia em São Paulo, e também adotou o prontuário eletrônico para uniformizar condutas médicas para o tratamento, o que propicia a otimização de recursos como exames e facilita muito a vida do doente.
Em comum em todas as operadoras, a porta de entrada no sistema de saúde se dá por meio de uma equipe multidisciplinar, com um médico de família à frente, que assume a coordenação do cuidado. A qualidade de vida melhora a partir das mudanças de comportamento induzidas e acompanhadas pela APS. Os benefícios da APS são inúmeros, porém, ainda temos muitos desafios como o de educar e convencer as pessoas da importância do modelo, bem como mostrar a eficácia da APS no que diz respeito à redução dos desperdícios, melhora na qualidade da saúde.
Dados recentes da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), entidade que representa operadoras de planos privados de assistência à saúde, mostram que só o desperdício no setor, com exames, consultas ou procedimentos desnecessários, causa impacto de 30% no preço do plano. Na outra ponta, os gastos médicos aumentaram 232% nos últimos dez anos, segundo a federação.
É certo que se trata de um processo lento, com a premissa de engajar e envolver todos do setor da saúde. Os resultados serão percebidos no longo prazo, dependem do esforço de todos os envolvidos em conseguir mudança cultural dos beneficiários, das operadoras, dos prestadores e dos empregadores, cabendo a todos o esforço em buscar resultados duradouros e sustentáveis Quanto mais dedicação houver a essa nobre causa, mais rápido veremos resultados positivos no financiamento da saúde.